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domingo, 12 de fevereiro de 2012

Depois de quinze anos de prisão e três processos, Patrick Dils é absolvido

O resultado da votação, lido em voz alta pelo representante dos jurados, de início não lhe parece compreensível. Um dos advogados segura-o pelo braço. Sua cabeça lentamente se vira. Os olhos se fecham, a vista reluta, o corpo é sacudido por soluços. Patrick Dils foi finalmente absolvido! Vertiginosamente, em sua memória, aparecem, quase que dia a dia, os últimos quinze anos. Longa batalha judiciária, demorados veredictos, sucessivas revisões de processo e um erro judiciário que lhe significou tantos anos de prisão.
As vozes crescem e espalham-se pela sala. Eleva-se um clamor de liberdade. No Tribunal, a presidente reprime as manifestações de alegria, por achá-las ‘inconvenientes’. Depois de três horas e meia de deliberações, os membros do júri que o havia condenado baixam a cabeça, como que reconhecendo os erros anteriores. Na quarta-feira, 24 de abril, o novo veredicto: Patrick Dils, é inocente, ou seja, foi declarado não culpado da morte de Alexandre Beckrich e Cyril Beining, dois garotos de 8 anos encontrados mortos com a cabeça esmagada a golpes de pedras em setembro de 1986, em Montigny-lès-Metz (Moselle), ao lado de uma via férrea.

Durante todos esses anos convencida da culpa de Patrick, Ginette Beckrich, a avó de Alexandre (uma das vítimas), a única da família a se fazer presente, se encolhe rapidamente. Do outro lado, afundado na cadeira, atordoado, depois de tantos anos de esperança e de luta, Jean Dils, o pai do acusado, está feliz mas muito doente para se manifestar de forma veemente. Justiça curiosa: Patrick Dils, ainda algemado e aguardando ainda algumas formalidades… figura de adolescente a um tempo sensato, disciplinado e emocionado. Sai sem dizer nada.
Uma hora e meia mais tarde, à porta da prisão de Saint-Paul, os primeiros passos de liberdade. Ladeado por seus dois advogados, Patrick sente-se ofuscado pela luz dos flashes, das câmeras, ainda surpreso. Fraco pelo longo período de inatividade, sua silhueta é visivelmente alongada. Primeiras palavras, primeiros momentos de vida do outro lado – a metade da sua, e tão longa para a sua idade. Venceu as barreiras. Diz que já tem um trabalho, em Paris, em uma gráfica, como almoxarife. Quer viver “uma vida simples”, às suas expensas.
Enquanto isso, o ambiente é de disputa entre os órgãos de comunicação: aqui um ‘quase-rapto’ logo à porta da prisão, pelos fortes braços de um repórter de emissora de televisão (“sem dúvida”, da Télévision Française –1). É claro que tudo deverá ser negociado. O rapaz, vestido com uma capa de chuva, como saído de um filme de Jacques Tati, oscila de um grupo de jornalistas para outro, separado do povo por um sólido cordão de isolamento. Responde às perguntas de uns, às de outros, dócil, quase aparvalhado.
Artesão da revisão iniciada em 1998, seu advogado, Dr. Florand, na última seção do júri pedira aos jurados “para esquecerem as duas primeiras condenações (prisão perpétua e vinte e cinco anos). Depois foi atacando os argumentos da acusação sobre o “monstro que havia tirado a vida de duas crianças”, aproveitando para apontar como provável assassino o ‘serial killer’ Francis Heaulme, que a justiça, doravante, em razão de forte conjunto de presunções, poderá perseguir, teoricamente.
“Qual é a probabilidade estatística, pergunta Florand, de que Francis Heaulme, presente na cena do crime no dia dos fatos, que vira as crianças, que tinha razões suficientes (poeira de pedra sobre o corpo), que já havia matado antes (especialmente o pequeno Joris Viville, de 8 anos, estrangulado e desfigurado a golpes de furador em 1984), que conhecia perfeitamente os lugares (pois os havia desenhado sem erros em um croquis, quatorze anos depois dos fatos), que fora visto no dia com o rosto ensangüentado, não fosse o autor do crime, ele que já tinha antecedentes criminais? Que mais deveria ser feito para persuadi-los?”. Denunciando uma investigação, na época dos fatos, “muito mal feita, fantasista e encomendada”, o advogado tinha igualmente verberado a instrução “demasiadamente rápida (os atos principais foram estabelecidos em menos de um mês), e desumana”. “Construíram um culpado ideal e dócil em lugar de procurar o verdadeiro culpado”, disse, citando casos em que houve erro judiciário em situações semelhantes, em razão especialmente de falsos testemunhos, levando à condenação de inocentes. “O erro judiciário é um mal público e a justiça deve reconhecê-lo”, concluiu Florand.
“A procura de um bode expiatório”, disse mais, “destruiu a vida de um inocente. A falta de bom senso, a negligencia, as traições e a fraude emparedaram vivo um adolescente”. E, dirigindo-se aos jurados: “Cabe a vocês declarar o seu desprezo à injustiça e ao ódio. Compete-lhes proclamar a justiça e a verdade e a inocência.! A nós  todos, Patrick, compete ajudá-lo a perdoar sem julgar.”
O conjunto das novas provas levou à absolvição. Ou, como diz o ditado: “A justiça tarda, mas não falha”.

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